Introdução Alimentar Complementar com a Enfermeira Diana Semião-Lobo e a Drª. Ema Monteiro

27-10-2023
 Introdução Alimentar Complementar com a Enfermeira Diana Semião-Lobo e a Drª. Ema Monteiro

Uma das fases mais importantes e desafiantes no desenvolvimento dos bebés é a introdução dos alimentos sólidos e o desmame do leite materno (Weaning). Como saber se a criança se encontra preparada para iniciar a introdução alimentar complementar? Como fazê-lo? Existem alimentos a evitar? Para esclarecer estas e outras questões, contamos com a colaboração da Enfermeira Diana Semião-Lobo, Especialista em Saúde Materna e Obstétrica, Assessora de Lactação, Especializada em Introdução Alimentar Participativa e Baby-Led Weaning, e da Drª Ema Monteiro, Nutricionista na área Materno-Intantil.

 

Quando iniciar?

A Organização Mundial de Saúde (OMS) recomenda o aleitamento exclusivo até aos 6 meses, tendo em conta que esta é uma das formas mais eficazes de garantir a saúde e a sobrevivência da criança1. Iniciar a Introdução Alimentar Complementar (IAC) antes dos 6 meses pode acarretar mais riscos do que benefícios para um bebé saudável.

“Estamos num país que ainda incentiva demasiado a introdução alimentar precoce - muitas vezes, sob o argumento da criança ir para a creche ou a mãe regressar ao trabalho. Ao iniciar a alimentação complementar antes do tempo, estamos a aumentar o risco do aparecimento de problemas de saúde no futuro, como: diabetes, hipertensão, obesidade, doença celíaca, alergias, intolerâncias, dermatites, entre outros. Infelizmente, estes riscos raramente são discutidos com os pais na consulta dos 4 meses. Depois, há também pouca orientação no sentido de preservar o aleitamento exclusivo no regresso ao trabalho e entrada na creche, o que não ajuda.”

Para iniciar a IAC, é importante garantir que o corpo da criança se encontra preparado, dando-lhe, para tal, a oportunidade de se manifestar livremente.

 

Sinais de que o bebé está preparado:

  • Consegue sentar-se e segurar o tronco com o mínimo de apoio
    “Se ainda não tiver esta capacidade, vai gastar uma quantidade incrível de energia a tentar manter-se direito e não tem a capacidade de se focar no que está a fazer com os alimentos. Uma posição correta é essencial para que o reflexo gag seja eficaz e evite o engasgamento.”

  • Começa a levar objetos à boca
    “É bom estimular esta ação através de mordedores, porque os ajuda a praticar a coordenação olhos-mão-boca e a desenvolver toda a musculatura orofacial.”

  • Faz movimentos de mastigação
    “Essencial para desfazer os alimentos em pedaços antes de os engolir, de forma a ser seguro.”

  • Manifesta interesse nos alimentos
    “Este sinal de prontidão é muitas vezes percecionado antes de existir, porque é confundido com a curiosidade. Os bebés são naturalmente curiosos e gostam de observar.”

A IAC, à semelhança de outros marcos importantes na vida da criança, como o andar e o falar, precisa do seu tempo, espaço e de sinais individuais.

 

“Os bebés começam a rebolar, gatinhar, a sentar-se, a levantar-se e a andar quando estão prontos. O que é que normalmente fazemos? Colocamos o bebé num tapete/manta no chão e deixamos que se mexa à vontade. Vamos ajustando o ambiente e introduzindo brinquedos e estímulos de acordo com o desenvolvimento dele. Tentamos não interferir, para que ganhe a sua autonomia, e intervimos apenas quando precisa de ajuda. O bebé vai-se arrastando até conseguir gatinhar - porque lhe demos espaço e oportunidades para desenvolver essa capacidade. E porque é que fazemos diferente com a alimentação? Porque é que determinamos uma data para ele começar a comer?”

 

Métodos de Introdução Alimentar

Existem três métodos possíveis:

- Tradicional “Parent-Led Weaning”, o adulto estabelece uma data para a introdução alimentar, geralmente sob orientação médica. Os pais são encorajados a reduzir a quantidade de leite oferecida ao bebé, para introduzirem os alimentos.

- Responsivo “Baby-Led Weaning”, o processo é liderado pelo bebé, com o suporte responsivo dos pais que interpretam os seus sinais. Neste método, os pais confiam nas capacidades do bebé e respeitam a sua autonomia.

- Misto

“Devemos começar a ser mais responsivos e respeitadores do desenvolvimento do bebé. Vê-lo como um ser incapaz, indefeso e dar-lhe um papel completamente passivo, é prejudicial para o seu desenvolvimento, para a sua saúde física e emocional.”

 

O que dar nas primeiras refeições?

Não existe uma regra. “A ordem de introdução dos alimentos é puramente cultural.”

A partir dos 6 meses, todos os grupos alimentares podem ser oferecidos (desde legumes, vegetais e cereais a carne, peixe e ovo), devendo a ordem ficar a critério dos pais.

Recomenda-se, no entanto, que o prato do bebé contenha:

  • Um alimento rico em energia (de alto teor calórico);

  • Um alimento rico em ferro, animal ou vegetal (e sempre aliado a um alimento rico em vitamina C para potenciar a absorção de ferro);

  • Um ou mais alimentos hortofrutícolas (aporte de vitaminas e minerais).

O que deve evitar?

Existem 2 tipos de alimentos que deve evitar dar, quer seja pelo risco nutricional, como pelo risco de engasgamento – podem ser oferecidos no caso de serem devidamente preparados.


Pelo risco nutricional, deve evitar:

  • Açúcar, doces e adoçantes artificiais
  • Leite animal como bebida (pode ser usado em receitas)
  • Peixe, carne e ovos mal cozinhados
  • Bebida de arroz
  • Sal adicionado às refeições
  • Sumos de fruta
  • Refrigerantes
  • Mel
  • Chás

Pelo risco de engasgamento, deve evitar:

  • Frutas e legumes duros, crus e/ou inteiros (Por exemplo: maça e cenoura)
  • Frutos secos inteiros
  • Pasta espessas sem barrar (Por exemplo: manteiga de amendoim)
  • Carne difícil de mastigar ou com ossos pequenos
  • Peixe com pele e/ou espinhas
  • Queijo duro
  • Salsichas e outros similares com efeito ventosa
  • Casca de fruta mais soltas
  • Grainhas e sementes maiores
  • Pipocas


Devemos adiar a introdução dos alimentos alergénicos?

As recomendações relativas à introdução de alimentos alergénicos mudaram radicalmente na última década. Atualmente, sabe-se que introduzir este tipo de alimentos entre os 6 e os 9 meses é fundamental para a prevenção de futuras reações alérgicas ou, pelo menos, evitar que as reações sejam mais graves.

 

Existem quantidades de referência?

Do ponto de vista científico, não existem evidências que comprovem a quantidade específica de alimentos que se deve oferecer. Cada criança tem necessidades nutricionais diferentes, conforme as necessidades energéticas, estatura, capacidade gástrica ou apetite.

 

“É preciso ter cuidado com o que colocamos no prato do bebé: aquela quantidade é uma expectativa do adulto do quanto o bebé deve comer. O melhor é começar sempre com menos e ir aumentando enquanto o bebé ainda demonstrar vontade de comer. O bebé já nasce com a capacidade de saber quando está saciado e deve parar. Vemos isso na amamentação em livre demanda. Na IAC não deve ser diferente, precisamos de confiar e ensinar o bebé a respeitar esse sinal de que está na hora de parar de comer.”

 

Um especial agradecimento à Enfermeira Diana Semião-Lobo e à Drª Ema Monteiro, especialistas que integram a equipa da Little Humans - Apoio à Parentalidade, Saúde e Bem-estar, pela colaboração.

 

 

Referências

1 Breastfeeding. (s.d.). World Health Organization (WHO). 

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